O material de construção mais consumido no mundo é o concreto. Areia – um de seus componentes - representa 30% do volume. A extração dessa matéria-prima, no entanto, enfrenta fortes restrições ambientais,
principalmente nas regiões metropolitanas.
De acordo com o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), a produção brasileira de areia acontece no leito dos rios (extração por dragagem) e nas várzeas (extração por cavas). Nos dois casos, os danos ao meio-ambiente são sérios e incluem alteração da calha dos rios e erosão da mata ciliar, entre outros problemas. Adicionalmente, aspectos econômicos também pesam. Segundo o informativo Massa Cinzenta, da Cimento Itambé, as operações que abastecem de areia natural a Região Metropolitana de São Paulo estão distantes, em média, 100 km dos polos consumidores. Com o agravante de o transporte representar 60% do custo total dessa matéria-prima.
De olho no cenário cada vez mais restritivo, a pedreira gaúcha Incopel resolveu investir na produção da chamada areia artificial. O material é um novo produto que agrega qualidade, devido à melhora na granulametria, sendo mais uma opção na construção civil. Nos Estados Unidos e Europa, a areia artificial ou de brita (ou industrial) já vem sendo adotada desde a década de 1970, segundo o Centro de Tecnologia Mineral (Cetem). Os dados, no Brasil, são escassos, mas há indicações de que ela represente cerca de 10% do consumo de areia para a construção civil.
No caso da Incopel, localizada na cidade de Estância Velha, Região Metropolitana de Porto Alegre, o tema é mais do que atual. Fundada há 49 anos e sob comando da segunda geração, a empresa enfrentava há dois anos um excesso pontual na sua produção de britas com granulometrias de 7/8 e 3/8, cujas pilhas estão localizadas no final do circuito de britagem formado pelos estágios primário, secundário e terciário.
Com uma clientela formada por construtoras e fabricantes de artefatos de concreto, a Incopel identificou a oportunidade de negócio. Posicionada entre Porto Alegre (que fica a 48 km) e as cidades da Serra Gaúcha (a 42 km), a mineradora conhece a realidade dos dois locais. Com a limitação de extração da areia natural, os consumidores locais viram o preço dessa matéria-prima disparar do patamar de R$ 40/m3 para R$ 100/m3. Na Serra Gaúcha, além do aumento de preço, o problema de transporte, que já pesa no custo final, tornou-se ainda mais complexo. Resultado: a pedra da Incopel, mais especificamente uma jazida de basalto, continuou no meio do caminho, mas ganhou valor.
“Nós já vínhamos avaliando como utilizar o excedente de 7/8 e 3/8”, explica Jorge Felippe Gewehr, diretor da Incopel. “Mas a combinação das restrições ambientais para a exploração de areia natural, com o consequente aumento de preço, foi definidora para a instalação de uma planta de produção de areia artificial”, resume.
A solução
Com a decisão tomada, a Incopel avaliou várias alternativas técnicas, optando pela ativação da unidade composta por um britador de rolo de alta pressão (HPGR), modelo HRC™800, da Metso Outotec, combinado com uma peneira Nordberg TS3.3, do tipo banana. “Trata-se de uma visão de futuro, mas que começa a se tornar realidade em função da qualidade dos produtos finais e da avaliação dos clientes”, explica Gewehr.
Iniciada em maio de 2014, a nova unidade é abastecida por um mix de brita 7/8 (70% do volume) e 3/8 (30%). O material, transportado por caminhões com capacidade de 18 toneladas, percorre 200 metros até a boca do alimentador que abastece – via correia transportadora – o HRC™ 800. Com capacidade nominal de 120 toneladas/hora, o equipamento pode ter suas configurações (pressão e velocidade) alteradas rapidamente. O ajuste da pressão influi diretamente na malha granulométrica final enquanto que a velocidade influi na quantidade de material processada pelo britador.
Eficiente energeticamente, o HRC™800 consome em média cerca de 48% da potência disponibilizada pelos dois motores de 150CV cada, enviando o material britado para a peneira TS3.3, com três decks, que faz a classificação determinada no projeto. No caso da Incopel, a título de teste, a mineradora já alcançou picos de produção de 126 toneladas/hora. Isso corresponde a um consumo de 0,84kW/tonelada de produto final no britador. Com movimento elíptico, essa peneira é caracterizada pela excelente estratificação e pela alta eficiência de peneiramento. O fato de ter uma velocidade de transporte decrescente (e não contínua como nos equipamentos
convencionais), o equipamento submete o produto britado a uma classificação na qual o tempo e a superfície são maiores, o que resulta numa seleção de partículas de granulometria próxima entre si.
Produtos
Na unidade da Incopel, a classificação produz três produtos finais. O primeiro é a brita de ½ polegada, usada na fabricação de postes de concreto e na pavimentação de rodovias. A brita de ¼ é o segundo produto classificado, sendo direcionada principalmente para a construção de tubos de concreto usados em obras de saneamento, e o mercado de artefatos de concreto, como os blocos intertravados. “Com a vantagem de permitir a economia de cimento, segundo meus próprios clientes”, ressalta Gewehr. Já a areia artificial, o terceiro produto, segue abastecendo o mercado de concreteiras e as fabricantes de tubos e concreto, entre os principais segmentos.
A definição do trio de produtos fabricados na nova linha da Incopel envolveu não somente o conhecimento da própria mineradora como também os recursos do laboratório de britagem da Metso Outotec, localizado em Sorocaba (SP). Além do basalto minerado pela pedreira, os técnicos da Metso Outotec avaliaram a mistura inicial que alimenta o HRC™ 800 e os três produtos finais. O resultado final foi um gráfico que ilustra a malha granulométrica nos estágios de classificação. Mais do que uma análise real do que está sendo britado e classificado, a análise forma uma espécie de mapa indicativo para os clientes da Incopel, que podem aprimorar sua linha de fabricação ou usar os materiais de forma mais adequada em campo.
O processo a quatro mãos – Incopel e Metso Outotec – não se limitou ao projeto e nem à entrega técnica. O acompanhamento regular está permitindo que a pedreira gaúcha faça testes pontuais na linha de produção. A montagem também contou com o suporte da fabricante. Do ponto de vista da organização do processamento
mineral, a próxima etapa da Incopel será a instalação de um sistema transportador de correias – dois lances, um com 12 metros e outro com 34 metros – para recolher as britas de 7/8 e as de 3/8, produzindo o mix e eliminando o transporte via caminhão.
Controle e automação
Operacionalmente, a linha é controlada por um único profissional. Alexandre Erthal, com 15 anos de carreira na Incopel, é responsável pela ativação do equipamento, inspeção do HRC™800 e da peneira e pelos controles do
sistema. O cérebro do processo é a central de controle, enclausurada numa sala de concreto, com vidraças. É desse ponto que Erthal aciona o circuito e acompanha os indicadores via a tela touch screen da central. “Funciona como uma tela de celular. É fácil, intuitiva”, diz. Hoje, a preocupação maior é a inspeção das correias que transportam o material britado, principalmente o alinhamento dos roletes. “O barulho é mínimo”, completa.
Areia de brita
Em termos estratégicos, Jorge Felippe Gewehr, mira mais longe. Ele identificou o mercado potencial de areia artificial, mas a proximidade da demanda foi uma surpresa. Uma concreteira vizinha é o cliente mais ativo, buscando quatro caminhões diários da areia artificial, matéria prima para a produção de tubos de concreto e blocos intertravados usados na instalação de pisos. “Ele reclamava da inconsistência da areia natural, o que levava à produção de um concreto muito variável em termos de resistência”, informa o diretor da Incopel. Desde que passou a adotar a areia artificial, o cliente e vizinho elogia a granulometria consistente e a cubicidade, fatores que aumentam a resistência do concreto.
O sucesso da Incopel na nova empreitada rende iniciativas que vem quebrando as resistências do uso da areia industrial. A empresa forneceu, por exemplo, a areia britada que compôs o mix de uma empreiteira gaúcha, responsável pela pavimentação de uma rodovia com 60 km de extensão. Cerca de 20% do volume total (a areia natural compôs os 80% da mistura) usado na produção de um microasfalto aplicado na estrada como camada superior do pavimento. Mais surpreendente ainda foi a avaliação de outro comprador, focado na aquisição de brita de ¼. Quando visitou a linha do HRC™ 800, o cliente pegou um punhado de brita e, espantado pela qualidade, resumiu: “esse material é joia pura”.
O próximo passo da linha instalada pode ser a produção de pó de pedra para rochagem, ou seja, uso como fertilizante agrícola. A viabilidade técnica e de negócios está comprovada, principalmente pela qualidade do basalto. A única adição de equipamento seria a de um aeroclassificador para recolher e acondicionar o pó em embalagens específicas. Em termos de precificação, o mineral supera, com vantagem, os fertilizantes importados. “Estamos avaliando essa possibilidade”, adianta Gewehr. A médio prazo, ele estima que a nova linha e seus três produtos venham a representar cerca de 20% do faturamento da Incopel.